Caminho do Sol: Rota de peregrinação inspirada no Caminho de Santiago

CAMINHO DO SOL rota de peregrinação inspirada no Caminho de Santiago

O Caminho do Sol é um roteiro que fica no estado de São Paulo entre as cidades de Santana de Parnaíba e Águas de São Pedro, passando por Pirapora do Bom Jesus, Cabreúva, Itu, Salto, Elias Fausto, Capivari, Mombuca, Arapongas, Piracicaba, e Artemis, totalizando 241 km. Originalmente, este caminho, criado por José Palma, foi inspirado no Caminho de Santiago de Compostela, e tinha como objetivo principal receber peregrinos caminhantes. Ao longo do tempo os ciclistas foram descobrindo este trajeto cheio de estradas de terra, paisagens bucólicas, trechos técnicos e muito contato com a natureza, e hoje, uma boa parte dos peregrinos fazem o caminho do sol de bike.

Pirapora do Bom Jesus – SP, nossa primeira parada. Desde Santana do Parnaíba são 13km

Os caminhantes fazem o caminho em 11 dias, e os pedalantes o fazem em 3 ou 4 dias, dependendo das condições físicas e disponibilidade de cada um. Claro que se pode fazer nos 11 dias, porém a bike nos dá a possibilidade de escolher as paradas que mais nos convém. O importante é não perder de vistas o objetivo da peregrinação que é a reflexão e o contato muito direto com a natureza, promovendo o auto-conhecimento.

A Preparação
A primeira coisa que precisaria ser levada em conta era o tempo disponível para executar o trajeto, e o momento escolhido foram os 4 dias do carnaval de 2010. Analisado o percurso e com a ajuda do idealizador do caminho ficou decidido que seria feito da seguinte forma:

1° trecho: Santana de Parnaíba - Pirapora do Bom Jesus - Cabreúva - Itu (Faz. Cana Verde), = 63 km
2° trecho: Itu (Faz. Cana Verde) – Salto - Elias Fausto - Capivari (Faz. Milhã)= 62 km
3° trecho: Capivari (Faz. Milhã) – Mombuca – Arapongas - Monte Branco (Piracicaba)= 68 km
4° trecho: Monte Branco (Piracicaba) – Artemis - Águas de São Pedro= 48 km

O início - primeiro problema
Saímos de casa direto para o metrô, para tomar o ônibus rumo a Santana do Parnaíba. Este ônibus vai até a rodoviária de Santana de Parnaíba. Logo de saída a minha corrente estourou e tivemos que providenciar o conserto embaixo de chuva, usando os únicos anéis de corrente para troca. Da rodoviária até a Pousada 1896 são apenas 100 metros.

Pousada Cana Verde – Itu, primeira noite

A 1ª noite - mal dormida
Eu não teria dormido a primeira noite na pousada se soubesse como seria. Era noite de carnaval e o pequeno bloco de rua passa em frente a pousada e a festa durou a noite toda. É fácil imaginar que foi impossível dormir!! Além de tudo, as condições da pousada não são nada convidativas. O quarto mal-cheiroso, o banheiro coletivo, e para ajudar chegou um grupo de 10 ciclistas fazendo barulho de madrugada, sem se importar com quem dormia, ou melhor, tentava dormir.

Para piorar um pouco o cenário, um dos ciclistas, do grupo de 10, chegou bêbado e se instalou em uma das camas vazias de nosso quarto, roncando muito alto o resto da noite.

O 1° dia de aventuras - novos amigos
Levantamos bem cedo e o dia estava com bastante neblina. O primeiro trecho é todo no asfalto, subidas e a maior parte sem acostamento. Foi preciso muita atenção e cuidado. O dia foi apresentando-se lindamente, e ao chegarmos a Pirapora do Bom Jesus, passamos em uma bicicletaria para revisão do serviço que tivemos que executar logo de saída. Estava tudo ok. Porém, não encontramos anéis de corrente para reposição. Seguimos sem. Logo na entrada do mirante da Cruz do Século encontramos um casal que fazia o caminho, ela de apoio, ele pedalando, e seguimos todos juntos. Durante uma conversa contamos que havíamos feito o conserto da corrente e como provisão divina ganhamos o material para reposição, do simpático casal.

Pousada Cana Verde – Itu, primeira noite

Depois disso, os perdemos de vista e seguimos sozinhos. Vale ressaltar que a vista que se tem da Cruz do Século é muito bonita, assim como a pequena estrada de terra que segue para a cidade; porém é um trecho que pode naturalmente ser evitado, caso queira ganhar tempo, pois passa por um single-treck seguido por uma pequena escada ao lado do cemitério, para sair novamente na estrada. Seguimos, na mesma estrada, rumo a Cabreúva, onde fizemos parada para o almoço. A dona da pousada nos recebeu muito bem. Neste ponto é possível usar a piscina e descansar antes de seguir.

Pousada Cana Verde – Itu, primeira noite

É importante saber que da estrada até o restaurante da pousada deve-se encarar uma bela subida em estrada de terra. Considerando o calor de 40 graus, tudo parece maior e mais difícil neste ponto. A deliciosa costela, arroz, feijão, purê de batata, salada e tudo mais nos renovaram as forças. Dormimos um pouco, esperamos o sol baixar e seguimos rumo a Itu. Novamente trecho de asfalto, sem acostamento, antes de entrar em estrada de terra. Passamos pelo armazém do Limoeiro e desta vez acompanhados pelo quiropraxista Junior, e pela simpática família (Toninho, Flora e Luiza). Paramos para descansar, tomar água, repor as energias e seguimos rumo a Fazenda Cana Verde, onde dormiríamos. Chegamos a Fazenda Cana Verde. Aparentemente um lugar muito bonito. Fomos levados ao galpão, onde nos hospedaríamos. Chegando, vimos um cenário desolador: sujeira por todo lado, camas velhas e sujas, com teias de aranha, banheiro em péssimas condições e um atendimento frio.

Bem vindos a Capivari

Chamei um funcionário e avisei que o quarto estava sujo, ele chamou a arrumadeira e esta "passou uma vassoura". Tivemos que nos conformar por aquela noite. Não tínhamos forças para prosseguir mais 18 km naquele dia, até a próxima cidade, ou o teríamos feito com certeza. O que me deixou indignada foi ver que esta pousada tem instalações muito boas para os hóspedes "normais", logo eles tem condições de oferecer um local digno para os peregrinos, mas não o fazem. A impressão que tivemos é que o fazem a contra-gosto. Depois soubemos que uma das ciclistas que havia chegado depois de nós foi impedida de entrar pela frente da pousada. Quando chegamos também fomos avisados de que a nossa entrada era a do lado, que dava direto no galpão. E mal sabem eles que éramos motivo de admiração pelos demais hóspedes, pela nossa coragem e disposição em fazer o caminho. Todos vinham falar com a gente para saber como era fazer o Caminho do Sol de bike.

De Elias Fausto a Capivari

Não havia se quer um lugar para trocar de roupa, uma vez que o quarto era comunitário e os banheiros não tinham divisão privativa para se vestir depois do banho. Homens e mulheres, todos juntos, se quisessem. Chuveiro com ralo entupido e uma cortina porca de plástico que mal cobria a porta. A sorte é que chegamos antes do grupo de ciclista que vinha logo atrás. Jantamos e fomos dormir. Claro que eles não oferecem nem um travesseiro, a menos que você peça para alugar. Pensando nisso levamos os nossos.

O 2° dia de aventuras - muitas descidas
Partimos rumo a Fazenda Vesúvio. Manhã fresca, dia lindo, mas prometendo muito calor!!! Teoricamente este foi o dia mais fácil da viagem, uma vez que o trajeto tem muitas descidas e grandes retões. Passamos na Fazenda Vesúvio para pegar carimbo no passaporte e seguimos em frente.

Na Pousada Milhã

Passamos por Elias Fausto onde almoçamos e descansamos, e depois seguimos rumo a Fazenda Milhã. No caminho encontramos mais três ciclistas que também dormiriam na Fazenda Milhã. Neste ponto tivemos ótimas companhias, no melhor alojamento do passeio. A Fazenda Milhã é muito bem equipada, com geladeira cheia de bebidas, no sistema pegue e marque, pague na saída. O jantar foi servido na salinha de jantar, havia três quartos, dois banheiros, tudo limpinho, bem equipado, toalha de banho e um farto café da manhã. Tivemos sorte, pois somente em 5 pessoas foi possível ter um quarto privativo e pouca espera para usar o banheiro. A Fazenda tem belos jardins e um atendimento muito amigável. Bata o sino ao chegar e aguarde, pois um jantar delicioso virá a seu encontro, após um banho relaxante. Foi um oasis, depois das outras "pousadelos".

Amanhecer na Fazenda Milhã

O 3° dia de aventuras - estradas difíceis
Forças renovadas, café da manhã tomado, alongamento feito, revisão de pneus e corrente, seguimos em frente, rumo a Mombuca. Este trecho é amigável, algumas retas, sempre em estradas de terra e subidas moderadas.

Chegamos a Mombuca, carimbamos nosso passaporte na pousada e partiríamos para Arapongas, quando fomos alertados que seria importante já almoçar ou fazer um lanche e abastecer de água, pois a pousada de Arapongas estaria fechada, porque só abre às quartas-feiras, e não há nada na cidade.

Da Fazenda Milhã a Mombuca

Não sabíamos de nada disso, se não tivéssemos sido avisados em Mombuca teríamos enfrentado sérios problemas de abastecimento, pois de Arapongas a Elias Fausto não há absolutamente NADA no caminho além de vegetação e muita cana de açúcar. Passamos na padaria, comemos um lanche, tomamos refrigerante, compramos água e providenciamos um lanche para viagem. Neste ponto os colegas ciclistas que haviam dormido na Fazenda Milhã conosco nos encontraram e já os colocamos a par da situação. Seguimos para Arapongas.

De Mombuca a Arapongas

Este é um trecho um tanto difícil, porque ai o solo começa a ter muitos cascalhos soltos, subidas e terra e quase nenhuma sombra. A sede é muito grande e a necessidade de tomar água é enorme, o que pode ser um problema se não estiver muito bem abastecido. Percorrendo este trecho encontramos uns dois pequenos bosques, ótimos pontos para descansar e refrescar-se na sombra. Foi muito fácil perceber o que o desmatamento faz com o planeta, pois quando nos deslocávamos do sol ardente para debaixo de algumas árvores a sensação térmica era de uns 3 graus a menos!! Impressionante!!!

Depois de muito pedal pela frente, muito sol na cabeça e muita subida com cascalho avistamos, milagrosamente, um caminhão pipa, jogando água na estrada de terra. Não tivemos dúvidas, corremos e nos colocamos debaixo da água. Nos refrescamos muito e seguimos de roupas molhadas, o que nos deu uma ajuda e tanto!!!

Atenção Ciclistas!!!

Em um dos pequenos bosques atolamos as bikes e sujamos bastante os tênis. Paramos para retirar o barro dos freios e das correntes. Perigo eminente! Chegamos na pousada em Monte Branco bastante cansados, o trecho era bem difícil, as subidas muito técnicas e o calor avassalador. Mas chegamos!!! Ficamos preocupados, porque desde Monbuca não tivemos mais noticias dos 3 colegas ciclistas. Avisamos na pousada e eles logo contataram a Fátima, em São Paulo, nossa "anja", que nos monitorava sempre que achava que estávamos demorando a chegar na próxima pousada. Com certeza o celular tocaria, se tivesse sinal.

De Monte Branco a Artemis

Os colegas ciclistas foram contatados e soubemos que estava tudo bem, que eles tiveram que trocar pneus algumas vezes e se hospedariam em Piracicaba, na casa de parentes. Tomamos banho, jantamos e recebemos massagem nos pés e nas pernas, feita pelas filhas do proprietário, que em troca recebem o quanto você achar que vale. Valeu!!! Fomos dormir bem cansados e ansiosos pelo último dia de pedal.

O 4° dia de aventuras - recebemos o Ara Solis Desta vez tivemos uma canja, a simpática família (Toninho, Flora e Luiza) ofereceu para levar nossas malas no carro de apoio deles. Que bom, pois o último trecho tinha bastante subida, muito cascalho e o sol parecia mais forte que em qualquer outro dia. Foi uma bênção. Passado o pior trecho de subidas encontramos a grande seringueira, enorme, frondosa. Parecia uma miragem no deserto. Ali estava o Anjo do Caminho, com frutas, suco, e lanche, esperando os peregrinos famintos. Comemos, bebemos, agradecemos, descansamos e partimos para o último trecho do pedal.

Águas de São Pedro - SP

A última parada, antes de imagem de São Tiago, foi na padaria para pegar o carimbo e usar o banheiro. Seguimos rumo ao centro de Águas de São Pedro, visitamos a imagem de São Tiago, na praça e finalmente, chegamos a Casa de São Tiago, badalamos o sino anunciando nossa chagada. Fomos recebidos pelo idealizador, Sr. Palma, para dar nossos depoimentos e receber a Ara Solis.

Fomos até a pousada Estrela da manhã, tomamos banho, descansamos e voltamos no mesmo dia para São Paulo. Tomamos o metrô, com as bikes e finalmente chegamos aos nossos lares felizes e em segurança. Realizamos um sonho!!!

São Tiago em Águas de São Pedro - SP

Eu jogo tomates: No desmatamento ao longo do caminho, retirando as sombras, e aquecendo o planeta, o descaso da pousada Cana Verde, eles podem fazer melhor. Eu discordo de quem não respeita o silêncio das trilhas e deseja impor seu ritmo barulhento aos demais, perturbando o momento de contemplação. Mais fotos: http://www.flickr.com/photos

Para conhecer mais sobre a história deste percurso sugiro uma visita ao site oficial: http://www.caminhodosol.org/historia.htm

Dicas

Para concluir o caminho do sol de bike com segurança foi essencial uma revisão completa da bike; além de providenciar todo o apoio necessário.

Equipamento para a bike:
2 câmaras de ar; extrator de corrente; anéis para corrente; kit de remendo para câmara e pneu; lubrificante para corrente; jogo de chaves; cadeado; alicate; lanterna; luz traseira; odômetro; camelbak; bagageiro; porta-mapas e bolsa de selim; Era muito importante levar pouca bagagem, uma vez que o trajeto exigiria força e resistência.

Bagagem Pessoal:
3 camisetas dry fit; 2 bermudas de bike; 1 blusa fleece; capa de chuva; 1 calça esportiva; 1 bermuda; 3 pares de meia; 4 peças intimas; 1 toalha de camping ou fraldas ou toalha de rosto; roupa de banho; 1 lençol; 1 mini-travesseiro ou travesseiro inflável (na maioria das pousadas existe a possibilidade de alugar roupa de cama para passar a noite). Kit de sobrevivência: gaze; micro-poros; luva cirúrgica; pomada para assaduras; anti-séptico; relaxante muscular; sal de frutas efervescente; analgésico; creme dental; escova dental; fio dental; repelente de insetos; bloqueador solar; protetor labial; colírio; lixa de unha; lenços umedecidos; papel higiênico; sabonete; mini-shampoo (tipo amostra grátis); mini-condicionador (tipo amostra grátis); celular e carregador de bateria; máquina fotográfica e carregador de bateria; barras de cereais; gel energético; (1 sache a cada 30 minutos de pedal garante energia mais rápida para o corpo, principalmente nos momentos de maior cansaço); frutas secas; maltodextrina; e chocolate (coloque numa caixinha de isopor, assim não derrete).

Transporte:
- Para Santana do Parnaíba - quem faz este trajeto a partir de São Paulo é a Empresa Urubupunga, a R$ 6,40. As bikes foram no bagageiro sem nenhum problema. O tempo desta viagem foi de aproximadamente 2 horas. - De Águas de São Pedro para São Paulo - empresa de ônibus Piracicaban tem ônibus direto para o Tietê, com passagem a R$ 36,00. Colocamos as bikes no bagageiro, sem problemas.


Roseli Ronchesi é fotógrafa amadora,mergulhadora, ciclista desde 2000. Já pedalou pelas principais trilhas do interior de São Paulo, vários trechos da estrada Real, e sempre participa de eventos ciclísticos pela cidade. Amante de viagens de aventuras, já escalou o pico das agulhas negras, fez curso de sobrevivência na Selva . Compartilha suas experiências de viagens,entre elas África do Sul e Galápagos em seu blog Imagens e Viagens