Pedalando e educando: 7º Relato

12° Diário - 31 de julho de 2002 Austrália

Ola amigos, Depois de New Castle fiz uma longa jornada na Austrália. Revezando pedaladas e caronas percorri quase toda a costa leste. Passei por Brisbane, Rockampton, Mackay, Hervey Bay, Townsville, Cairns e várias pequenas cidades.

A temperatura mudou radicalmente nesse percurso. Atravessei o Trópico de Capricórnio e estou cada dia mais perto da linha do Equador. O frio de New South Wales foi substituído pelo calor dos Trópicos Úmidos de Queensland. A mudança no comportamento das pessoas também foi forte. No norte as pessoas são mais alegres e receptíveis. Airlie Beach, Magnetic Island, Cairns e a barreira de corais foram os locais mais interressantes dessa etapa. O país passa hoje por uma situação econômica muito boa. Sua história conta com alguns "altos e baixos" -

Depois de ser colônia penal inglesa, passou por uma fase rica na "Corrida do Ouro" em 1850, uma depressão econômica no começo do Séc. XX e hoje vive novamente em tempos de fartura. Aqui não vi pobreza. Nos últimos 20 anos o turismo se transformou no maior contribuidor da economia nacional. Segundo o Cultures of the world (1991) a Austrália recebe a visita de 2 milhões de turistas por ano. Japão, Estados Unidos, Nova Zelândia, Inglaterra e Alemanha são as principais fontes. O turismo interno também é forte. O sonho de consumo de australiano é viajar de trailler pela Austrália se aproveitando da excelente estrutura de Caravans Parks e centenas de parques. O retorno dos impostos pagos pela população é claramente visível nas estruturas urbanas.

Os aventureiros de trailler, em geral casais com mais de 40 anos, utilizam mesas, água, banheiros e muitas vezes churrasqueiras com gás gratuito distribuídos por toda Austrália. Logicamente essa estrutura foi muito bem vinda para mim. Minhas cozinhas foram essas churrasqueiras grátis, conhecidas como barbecues, onde fazia minhas refeições. Aqui tentei de todas as formas diminuir meus custos mas tudo é realmente muito caro para um sulamericano. Decidi diminuir meu tempo na Austrália para não "falir" o projeto e peguei várias caronas nesse último trajeto. Austrália é um dos países mais urbanizados do mundo. 85% da população vive em cidades. Os fazendeiros são menos de 1% da população. Estou tendo uma visão parcial desse imenso país. Estou passando apenas na costa leste, bastante habitada e urbanizada. O resto da Austrália é praticamente um deserto árido e despovoado. De Newcastle fui para Toronto onde dei uma aula na Toronto High School. Percebi que os alunos só se concentraram quando comecei a falar de lugares pobres da América do Sul. É difícil explicar o que é pobreza para alunos que vivem num país com renda per capita de mais de vinte mil dólares por ano e os desempregados ganham do governo quase dez vezes o salário mínimo do Brasil. Em geral as diferenças de salários são muito pequenas. Dentro de uma empresa o cargo mais alto dificilmente chega a ganhar mais que 20 vezes o valor do cargo mais baixo. Aqui a palavra fome não existe.

 

Brisbane

Voltei para Newcastle de onde fui de ônibus para Brisbane, no sul de Queensland, a maior cidade do estado. O frio seguia forte. Com meu terrível saco de dormir eu quase congelava nas noites em que acampava. Na saída da cidade existe um trecho da highway proibido para bicicletas e tive de utilizar umas estradas menores que passam pelo interior.

Algumas cidades parecem um pouco com filmes de faroeste. Em Gympie por exemplo fiquei hospedado em cima de um bar com as portas "bang bang", balcão de madeira, um bando de homens bebendo cerveja e uma loira servindo. Do interior segui para Hervey Bay onde me encontrei com o João Guimba e a Paty, um casal de paulistas que está fazendo a volta pela Austrália numa Van. Aproveitei a oportunidade da carona e seguimos juntos até Townsville.

Mata nos Trópicos Úmidos ao norte da Austrália

Apesar do meu esforço para ver coala e canguru livres, foi somente num parque em Townsville que consegui ver esses animais. Na verdade vi muitos cangurus mas todos estavam mortos atropelados. Aqui é o habitat perfeito para o coala que se alimenta das folhas das mais de 400 espécies de eucaliptos australianos. Estou passando aqui no inverno para evitar a umidade excessiva das monções e também os ciclones.

Fontes alternativas de energia para evitar a poluição ambiental

Apesar de todo cuidado com o meio ambiente, segundo o Atlas da Austrália da Header's Digest, desde a ocupação européia o país liderou a quantidade de espécies de plantas e animais que entraram em extinção. Os colonizadores introduziram vários animais para praticarem esportes de caça ou diversão, principalmente raposas e coelhos. Hoje estes animais se transformaram em grande problema para o ecossistema.  Outro problema ambiental é a energia. Combustíveis fósseis proporcionam grande parte da energia australiana mas polui muito a atmosfera quando é queimado. Pesquisadores estão buscando meios mais eficientes e menos danosos de usar suas reservas de carvão e gás e desenvolvendo fontes renováveis de energia e formas de captar a inesgotável energia solar, eólica e marítima. Aproveito o assunto para uma dica pessoal: Nunca mais comprem pilhas comuns ou alcalinas! Estou usando pilhas recarregáveis de NiMH desde o começo da viagem. Carrego seis pilhas e um pequeno carregador que funcionam perfetamente. Além da economia financeira estou com a consciência tranqüila de não estar jogando dezenas de pilhas usadas, venenos químicos para a natureza, no lixo.  Fiquei impressionado com a quantidade de periquitos (psitacídeos) que vi.

Pelicanos em Queensland

Aqui ninguém tem gaiola. Todos os pássaros vivem soltos e é possível encontrá-los de todos tipos e cores. Além dos periquitos encontrei muitos pelicanos no litoral e vi um dos habitantes mais exóticos daqui, o platy-pus, que combina características de mamífero e pássaro. A topografia plana do continente influencia não somente a pluviometria mas também os cursos dos rios. Os rios que correm para o mar nascem na costa e possuem pequenos cursos. Os rios de dentro do continente são cheios de curvas e sempre secam antes de chegar no litoral. Em Townsville fui mergulhar na famosa Barreira de Corais.  Não é uma barreira contínua e inclui aproximadamente 2800 conjuntos de corais que variam o tamanho entre um hectare até 100.000 ha. Estima-se que existam 1500 espécies de peixes, mais de 300 espécies de corais, 4000 moluscos e 400 espécies de esponjas. Além da parte submersa a reserva compreende também 600 ilhas, dentre elas a Magnetic Island.

Magnetic Island - Queensland

Depois dos dois dias "turísticos" fui dar uma aula na Cleveland Training Centre para alunos de um Centro de Detenção. Foi uma experiência diferente e bastante interessante. O Centro de Detenção deles é realmente um local para aprendizagem e reinserção social. Possui quadras esportivas, piscina, escola, etc. A mudança climática perto de Townsville é radical. De Cardwell para Tully por exemplo em apenas 43 km de distância a média anual de chuva simplesmente duplica.  Segui viagem passando por algumas cidades que guardam uma herança da grande corrida do ouro que ocorreu em 1850. Hoje essa região é umas das áreas rurais mais ricas do país. Grande produtora de tomate, feijão e açúcar. E possui as maiores minas de safira do mundo. Passei vários dias atravessando plantações de cana. Perto de Inghan dormi em uma fazenda e conheci um pouco do dia a dia dessa produção. É totalmente mecanizada e emprega pouca mão de obra. Em geral a família trabalha unida.

Townsville

O salário de um trabalhador na plantação é de aproximadamente 80 US$/dia (o equivalente ao salário mínimo mensal do Brasil). Várias pequenas cidades ao norte de Queensland possuem Usina de Açúcar e têm cheiro de rapadura. Agora, no inverno, é a alta estação do norte australiano. O clima é quente (19 a 27 graus) e seco. No verão as monções atingem essa região e chove todo o tempo. Algumas estradas possuem uma régua para saber qual a profundidade que o carro vai submergir nas pistas que ficam inundadas. 

Casas do norte da Austrália - Estilo "Queenslander"

As casas no sul, de Sydney até Brisbane, possuem paredes duplas de tijolo ou madeira para isolar termicamente a casa. Em geral possuem no mínimo três quartos, sala, cozinha e sala de jantar. No norte as casas possuem grandes varandas que são utilizadas para dormir no verão. Quase todas são construídas sobre palafitas para aumentar a circulação de ar e proteger a casa de inundações. Os carpetes usados para esquentar as casas inglesas acabaram influenciando as casas de Queensland e muitas possuem carpetes mesmo vivendo em uma região quente e úmida. Perigo! Crocodilos... Aborígenes - Infelizmente não estou passando por nenhuma área oficialmente aborígene. Quanto mais pedalo para o norte mais encontro aborígenes. Encontrei uma parcela que já está deturpada pela urbanização e vivem completamente deslocados. Infelizmente quase sempre estão bêbados. Acredito que nas reservas poderia encontrar a verdadeira cultura desse povo que imagino ser muito interessante. Em Darwin poderei conhecê-los melhor. Finalmente cheguei em Cairns, principal cidade do norte de Queensland e muito procurada pelos turistas que querem visitar a barreira de corais. É ponto de parada de vários barcos e local onde estou tentando uma carona de veleiro para Darwin ou algum lugar no sudeste asiático. Torçam para que eu consiga um veleiro para Indonésia e comece as Rotas da Cia das Índias Orientais! Um grande abraço, Argus.


PATROCÍNIO: Cultura Inglesa APOIOS: Atex Lajes Nervuradas, BHZ Arquitetura, SOL Serviços On Line, Aliança Francesa, Prudential Bradesco, Rotary Club e Telemig Celular *Os Textos completos você encontra no site: www.pedalandoeeducando.com.br

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